segunda-feira, 19 de julho de 2010

Scrap.

Um passo atrás do outro. Era assim que ele se comportava a medida que andava naquela calçada a beira-mar de um dia de chuva. Ventava, fazia frio, as ondas arrebentando nas pedras e ele era a única alma viva que caminhava por ali. Na rua, o céu era refletido pelo pequeno espelho d’agua que se formava sobre o pavimento e algumas vezes, ele via o próprio rosto refletido. Isso fazia ele torcer o nariz. Não queria se ver. Algum sentimento aversivo que seu reflexo trazia. Nada de mais, ele teimava em mentir para si mesmo. Caminhava de cabeça baixa, chutando pedrinhas, ensaiando conversas na sua cabeça, criando um roteiro de como agir em determinadas situações, que no fundo ele sabia que não aconteceriam ou que ele não agiria da forma recém ensaiada. Viu seu reflexo mais uma vez em poça de água. Torceu o nariz e fez questão de pular com os dois pés nela. Bufou e voltou a caminhar. Seu olhar não era totalmente para o chão, mas não era reto. Era como se mirasse o chão a uns 6 ou 8 metros a frente. Olhar de gente que não sabe o que fazer. Parou, se virou na direção do mar e caminhou pela areia. Se abaixou, pegou um galho deixado ali caprichosamente pelas forças do destino e começou a brincar com o solo. O olhar estava no oceano vendo as ondas que não se decidiam. Qualquer semelhança não era mera coincidência. Suspirou, fechou os olhos. O risco de que aquela quantidade de água pudesse refletir mais uma vez o rosto dele o fez fugir disso. Foi quando ele sentiu algo na sua perna esquerda. Olhou para baixo e lá estava um cachorro, empurrando areia em cima dele com as patas traseiras. Ele ficou alguns segundos em choque enquanto o cão se afastava lampeiro. Sorriu, riu, gargalhou.

Era apropriado.